quinta-feira, 23 de julho de 2009

Quatro


Arrancando-me do peito expectativas infantis, Patrícia resolveu não falar palavras de amor, não falar nada. Muda, estática, olhou com olhos molhados, olhos sem expressão. Procurou no céu, no chão, ao redor, qualquer coisa que queimasse, congelasse, qualquer sensação nova. Patrícia é sensação, tudo que quer é experimentar, conhecer novos mundos, criar seu mundo novo todos os dias. Nem a crença silencioso-gritante no meu amor a faria estar ali sem buscar algo novo. Eu, monótono, estanque e indefeso nada poderia mudar daquele momento, nada poderia fazer sobre aquele tempo. Nós e o tempo aparentemente perdido nada podíamos fazer, pensar podíamos, então pensei que mesmo inversamente proporcionais mais uma vez sentíamos o mesmo, e, mesmo a esmo e impotentes uma ponta de sorriso ameaçou saltar meus lábios. Inertes em pensamento, ação e medo. Unidos unicamente pela monotonia da cidade, pela música silenciosa ouvida de forma plena, clara, quando em soluços iniciamos a cantarolar: “It's always best when the light is off It's always better on the outside (…)Climbing up the walls Climbing up the walls Climbing up the walls”. Tristes comungávamos infelicidade, angústia. O parque tantas vezes palco de momentos felizes, presenciava decadente a decadência do que pode ter nunca acontecido. Será que existe Patrícia? Ela não é um sonho, eu a criei ? Num devaneio essas questões viam a tona, nem pude resolver, no momento estava entre a dor de sentir e medo de não ter, de deixar de ter o que talvez nunca... Meu pensando dando lugar a voz de Patrícia rompendo o silêncio

- Penso que te amei, é, amei, se isso não resolve ao menos massageia seu ego. Não me importo com o meu, você não foi capaz de deixar-me uma vez que fosse insegura temerosa a te perder. É o risco de não te ter que me leva a ser como sou. Você , todo retilíneo, eu... Não há o que pedir, há muito a fazer e aqui estamos sob a luz da mesma cidade, respirando o mesmo ar católico e burocrata de um lugar que não gostamos, você e eu como dois patéticos perdedores, vamos, prefiro dormir até segunda.

- É sempre assim , não é ? Vai ser sempre assim, você, suas conjecturas, razões inabaláveis sobre o mundo, sobre mim, nós. Concordo quando reconhece sermos patéticos, de um lado eu entregue a quem desconheço, do outro você e suas verdade absolutas.

Na certeza adolescente de estar presenciando o fim da minha vida amorosa desatei a chorar, boys don’t cry? Por mais genial que seja a idéia, garotos choram é um choro velado, choro interno, sincero. Garotas podem até chorar, mas, desse dia em diante o choro feminino passou a ser mais bem analisado – nada contra vocês leitoras assíduas desse aspirante a escritor – mal sabia que aquele sorriso não era decifrável e que seu poder sobre mim teria voga permanente. Rachacei a dor e por instantes entreguei-me novamente a mim mesmo. Patrícia seguiu por um lado, ali fiquei.

Helder Santos

04:49 pm

23-07-2009

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Um

Uns se apaixonam num simples olhar, outros numa frase de efeito, alguns preferem conhecer bem à outra pessoa antes e daí, se entregar. Ela pesava ser diferente, precisava de coisas sólidas por estar cansada do mundo vazio comum a cidade onde morávamos. Vivíamos num lugar pacato, uma cidade católica cheia de prostitutas, drogados e freiras. A melhor descrição do lugar estava nas pessoas que faziam coisas normais, mesmo a minoria delas servindo como padrão de uma cultura a ser seguida: meninos católicos, virgens, bancários, professores, padres, quem sabe até policiais. A cidade, sinônimo de monotonia se agitava para o desfile de bons modos expressos por esses grupos. Em meio à ausência de olhos observadores Patrícia me beijou pela primeira vez. Era sábado, a cidade parecia agitada com alguma festa popular que acontecia a ponto de nos deixar a sós pela primeira vez. Estávamos na festa de uma amiga , Lucia; Lucia era uma boa anfitriã, nos recebia em sua casa, cujo progenitor, distinto homem da cidade, um senhor pacato como a maior parte dos que lá viviam, gostava de receber os amigos da filha e logo se retirava, preferia deixar a turma à vontade e nós ficávamos. Após algumas horas de boa música Patrícia falou algo doce como uma criança querendo colo, não resisti ao brilho azul elétrico de seus olhos, beijando-a. O gosto de seus lábios misturava desejo, paixão e medo. Trememos juntos, sorrimos juntos.

Sem cansar aos olhos da beleza inerente a ela. Lindos olhos, ora sorridentes ora assustados. Às vezes era preciso pedir para fechá-los, com prêmio de recebê-los abertos, tenros, ávidos de nós.

Gritos trêmulos misturando dúvida, euforia e êxtase saíam da garota insegura cheia de sonhos e indecisões. Patrícia não sabia o que fazer agora que tinha conseguido o que desejara há meses. O que ela pensava: como seria a próxima vez, teria próxima vez, ele gostara realmente dela? Temperado ao som da canção preferida no momento É só saudade, Ludov . Patrícia berrava os versos com a força íntegra de suas cordas vocais - gritando ou não, ela permanecia linda –. Horas a fio lendo um de seus livros: Uma bondade complicada de Mirian Toews. Enquanto foliava observava referências de cultura pop, para sua discografia, Led Zeppelin, cars, Beatles etc. Ela gostava de canções de amor e por sua vez fazia-me gostar. E, mais ou menos assim, nos apaixonamos.

Conversávamos todos os dias. Seu poder de sedução é algo que não se pode medir com palavras. Teatral, musical intensidade expressa em gestos, sons, olhares. Nada escapa a inteligência de menina mulher que ela possui. Enquanto falávamos coisas sérias, esperava a vez de falar e sutilmente lançava alguma frase de efeito como quando conversávamos sobre música, esse era nosso elo principal. Ela entendia de música, gosto de conversar sobre as coisas dela, é mais pessoal pra nós, faz-me sentir próximo do brilho púrpura de maça em seu rosto. Ela ruborizava com qualquer coisa que eu fizesse, eu me sentia, dizia uau! Um dos marcadores de Patrícia era uau, acabei pegando dela.

Enquanto a cidade agitava sua monotonia preferíamos trocar idéias sobre música e livros que gostávamos e assim nos tornávamos amigos apaixonados, acreditando não haver amor sem amizade. Além de ler e ouvir boa música os jovens em Uberaba gostavam de beber e fumar. Certo dia, pegamos alguns cigarros e seguimos em direção ao parque Jacarandá, lá chegando, procuramos uma árvore e sentados apoiando nas costas um do outro. Fumamos observando animais e plantas por horas. Plantas são tão vivas disse ela enquanto acendia mais um cigarro. – Acho legal esse lance com a natureza, a cidade oferece, aproveitemos. Ela balançou a cabeça aprovando. A noite caía e precisávamos voltar. Patrícia voltaria, a cidade nunca seria a mesma para mim.


Helder Santos
Janeiro de 2009

Dois

Garotos assustados não sabem dizer eu te amo. Pensei em voz alta, ela ouviu, ouvia tudo que eu falava, tinha ouvido tuberculoso, sendo expert em desvendar o que você pensa antes que falasse algo, aí, quando você falava, ela já estava com a resposta certa, a palavra que te levaria (me levava) às nuvens ou ao inferno. Às vezes chegava ao céu, às vezes era guiado ao inferno numa carruagem metálica de flores.

- Que pensamento mórbido – disse Patrícia com ternura-. Preciso de espaço, você não entende.

- Entender? Como entender algo louco assim, uma hora você diz querer, segundos depois, some, te procuro em todos os lugares imaginando te ver no mais sagrado de deles, meu sentimento. Lá está você, doce, amável. Aqui estou sem seu abraço -. Disse isso com toda calma que o amor pode ter, ela pensou alguns instantes e disse:

- Pessoas correm de um lado para outro sem explicações plausíveis tendo ou não um sonho morto, vivo. Garotos são quase invisíveis gostando de alguém. Para todos que pensam que os homens são seres felizes e mulheres infelizes, aí vai um retaliação, mulheres fazem o que querem quando homens demonstram um sentimento bom... mulheres são perspicazes. Quando um cara se apaixona por uma garota, faz planos, cria milhões de possibilidades de estar com ela, a garota, por sua vez, observa lentamente cada ato que ele toma, fica a espreita, nega defeitos normais a idade, foge da responsabilidade compreensiva em ser companheira espera seu garotinho ficar vulnerável, se isso acontecer, algo em você se foi junto com o amor que veio, não sou culpada, gosto de você, tudo que preciso é de tempo, entender o que está entre nós, metade de mim não responde por si.

Mesmo assustados garotos amam, o mesmo se deu com Patrícia. Enquanto desejava estar junto a mim estava tudo bem, quando teve o melhor que pude dar, assustou-se, sumiu. Uberaba é uma cidade pacata , enquanto Ela buscava novos horizontes, lugares que proporcionassem liberdade, - não entendia muito bem aquilo, o ar de uma cidade onde garotos sabem dizer eu te amo fabricava garotas fugindo do amor - e, mesmo que ela ficasse, iria noutro momento. Mal sabia eu que o drama da mulher sumindo se repetiria de forma mais assustadora que dois, três dias ou uma semana de ausência.

Contava os minutos, desejava seu retorno, pensando alto : - volte, seu lugar é aqui, só aqui.

Patrícia tinha muitos amigos, sempre gostou de festas. Em lugares agitados conversava com todos, conhecidos, desconhecidos, enfim, ela desbravava a mente das pessoas com uma facilidade aterradora. Idealização ou não, vejo isso nela, é mais forte que eu. Certa vez, num bar de uma cidade vizinha, ela avistou um quadro, pensei que passaria desapercebida. Após um fuminho, olhava o quadro lentamente. Ele lembrava um mosaico. Vários quadros pequenos nas extremidades com a imagem de um homem no centro. Eu, impaciente diante tanta concentração - nossa primeira vez em outro lugar e ela preferia olhar um quadro, me perguntava atabalhoado -.

- Maquiavel?! Maquiavel! Gritou a plenos pulmões enquanto arrastava-me até o quadro.

- Sabia, Maquiavel, Nicolau Maquiavel.- Disse ela

- Pode ser Camões, ele tem o mesmo olhar - Disse inseguro.

Isso acontecendo comigo, esqueci de revelar-lhes meu nome, me chamo Paulo, tenho 22 anos. Perto dela parecia uma criança, minto, a entrega me fez assim. Tinha consciência de que ela não queria um garoto, precisava de um homem. O homem em mim estava à espera de seus olhos, fugidos, tensos, amáveis. O tempo quando passa é o espelho dos relacionamentos, quando para é o sentimento presente e vivo nas ações presentes. Não sentimos o tempo passar quando estamos entregues a esse tempo de paixão, amor. São sentimentos contraditórios, desejáveis, seria essa a graça?

Helder Santos



12 -01-2009



3:50 am

domingo, 19 de julho de 2009

Três


Lembro dos primeiros encontros, ela fazia planos, falava da vida como um lugar a ser explorado, sempre que escutávamos Pink Floyd ela viajava, lançava teorias de como seria um relacionamento perfeito, de como pessoas se encontram, se perdem, se amam, deixam de amar, Patrícia tinha esse dom, eu viajava com ela, não sabia como não me envolver estava nisso até último fio de cabelo, era amor. Perguntei por que não retornava minhas ligações, ela poderia dizer que odiava telefone ou que não queria falar com seus pais por perto, eis o que ela disse.

- A vontade de sentir sua voz é maior que a razão, às vezes te ligo, não consigo evitar o que preciso. Mesmo parecendo infantil não consigo ser ausente, o abrigo da sua voz é maior que a dúvida do lugar que você está agora. Nem faz tanto tempo e já sinto sua falta, não ver seus olhos é sinônimo de dor, é como se algo faltasse em mim estando em você... todo esse brilho, toda energia de garoto que não para quieto e mesmo parado é movimento me fascina, envolve, unifica o antes sedimentado, adoro. Certa vez li algo interessante, uma menina gostava de um cara, eles nunca se encontravam por ambos temerem como seria. Num certo dia o acaso fez às vezes do encontro, estão juntos até hoje. A vida é feita de acasos e certezas, a vida é algo imprevisível, quem sabe essa qualidade não seja intensa, louca, apaixonante. – disse ela.

Como dizia, nada foge ao olhar atento da menina, nada escapa de seus sentidos. Instinto deveria levar seu nome, sobrenome, apelido. Instinto é ela própria.

– Sempre imaginei que amor seria algo completo, e que as pessoas não temeriam esse poder catalisador do amor, achei ter amado outros garotos, achei que amor seria só felicidade, sempre choro quando amo, tenho chorado mais ultimamente, não conseguir parar de pensar em você faz com que eu precise parar de falar com você. Palavras somem, medo surge e mesmo você se mostrando próximo não consigo te ver, tenho medo, é uma angustia que toma meus sentidos, minha razão. Meu mundo se vai quando você chega. – Dizia isso com um olhar tímido que qualquer um negaria malícia.

- Não fique assim, entendo o que sentes , carrego comigo a dor, a alegria de sentir, te amo! Te amo. Repetia essas palavras sem temor algum, sabia que ela precisava ouvir a verdade, sabia que nós éramos verdadeiros.

Na verdade desconhecia como agir nessas horas, desconhecia a mim mesmo. Ela, só ela me fazia ser o que sou, pensar como pensava, ingenuidade a parte, acreditava nisso, acredito até hoje? Não sei, nem você sabe.

Calmamente ouvi uma palavra molhada em soluços de choro:

- Te amo. Volte. Disse minha pequena.

Janeiro de 2009.

Helder Santos

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Entre mãos o tempo, entre tempo! Nosso final feliz.


No futuro, sua pele - imagem nunca esquecida- toca meus olhos com gosto novo. Talvez o medo, a distância concatenando tudo que houve, que não houve. A promessa parcialmente esquecida no algum dia haver. E, sentimos a distancia o cheiro azedo de um fim sem início certo, de um sentimento morto sem presenciar a vida cantada ilusoriamente por você ou por mim. Estamos frios, densos a o não-sentir pernicioso do fim, ao temor desesperador do possível encontro nos levar ao lugar incerto que nos encontrávamos estáticos ao medo de amar. Cansados, inertes a aparente resolução silenciosa das monossilábicas os dedos não redigem, o sentimento não divaga, a boca seca.

No presente, coadjuvantes, convivas vivem conosco momentos destinados a nós como atores principais de uma obra que sabemos ser unicamente nossa, permitimos, acatamos a mão invisível do tempo tomando de nós o que nunca foi deles. Sorrimos alto escondendo em silêncio a dor de estarmos separados. Mais uma vez... E mais ainda, acreditamos piamente no desfecho infeliz de nossos convivas, amantes “sem importância” preenchendo lacunas heterogêneas em nossa homogeneidade.

Do passado, a certeza aparente do melhor final em sermos quase amantes. No presente, amigos levando-nos a riso, lágrimas de felicidade. Nosso final feliz exposto a plataforma temporal do não ser não dignifica em nada o que sentimos sobre o mesmo futuro nos fadando a sonhar com o presente que não vem.

Helder Santos

16-07-2009

21:27 pm

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Promessa ao próximo dia dos namorados

Te abraçar, segurar sua mão. Contar dos dedos ao pescoço o que é estar contigo.
Ser teu amante, teu amigo. Em devaneio presentear-te com o olhar de quem sabe o que é ser pleno e na repetição desses gestos levar uma vida por você, pra você, por nós.

Helder Santos

15-06-2009
11:02 am